Com um eleitorado de apenas 2,3 milhões de pessoas, o segundo menor do Nordeste, Alagoas já foi berço de três presidentes da República, de um presidente do Congresso Nacional e de um chefe da Câmara dos Deputados. A despeito do protagonismo nacional, o estado hoje registra mais da metade da população em situação de pobreza e ostenta a última colocação no ranking no índice de desenvolvimento humano (IDH) no país, marca que revela a vulnerabilidade da região em questões como educação e esperança de vida. A situação calamitosa contrasta com as preocupações políticas que cruzaram a fronteira de Alagoas para bater à porta do governo federal. Nas últimas semanas, o presidente Lula teve de abrir seu gabinete para uma miríade de reclamações, acusações e ameaças trocadas pelos dois principais caciques do estado, que há anos se engalfinham numa renhida disputa de poder que descambou recentemente para a baixaria, virou um caso de polícia e pode se tornar um fator de grande instabilidade para o próprio governo.
A hostilidade envolve o deputado Arthur Lira (PP), presidente da Câmara, e o senador Renan Calheiros (MDB), ex-presidente do Congresso. Ninguém sabe ao certo qual foi o marco zero do desentendimento. Nenhum deles gosta de falar sobre isso — ao menos não publicamente. O conflito, porém, antes restrito às contendas paroquiais, começa a ganhar uma dimensão infinitamente mais grave. Na semana passada, a Polícia Federal realizou buscas nos endereços de um grupo suspeito de fraudar licitações em prefeituras de Alagoas. Um assessor de Lira surgiu entre os investigados. Para o presidente da Câmara, a investida teria sido articulada por interessados em minar seu poder — petistas e ministros do governo — e incentivada pelo seu desafeto. O deputado levou o caso ao presidente Lula, advertiu que ações como aquela poderiam prejudicar as relações entre o Executivo e o Legislativo, ouviu a garantia de que o Planalto nada tinha a ver com a incursão policial e foi aconselhado a enfrentar a situação.
Renan Calheiros também procurou o presidente. Acompanhado de outros senadores do MDB, ele negou qualquer influência no caso policial e sugeriu a Lula que formasse uma coalizão na Câmara à revelia de Lira, buscando ele próprio uma aproximação direta com os deputados do Centrão e dar mais atenção ao Senado — uma maneira de mitigar os poderes do presidente da Câmara. Em ambas as conversas, o petista deixou claro que não pretende se tornar árbitro dessa disputa e fez acenos duplos para não melindrar nenhuma das partes. Lula levou Renan Filho a tiracolo na viagem que fez à Bahia, onde participou de uma feira agropecuária e diante de apoiadores, fez questão de elogiar a atuação do ministro. Ao mesmo tempo, trocou telefonemas com Lira e, em tom de brincadeira, disse que levaria a dupla em uma próxima viagem. “Você fica de um lado e o Renan do outro”, ironizou o presidente.
Fonte: Veja